(CONTINUAÇÃO)
Há ainda um terceiro conjunto de escritos budistas que está neste cânone Tripitaka, chamado Abhidharma, que são comentários de Mestres sobre os sutras. Isso ficou mais ou menos congelado uns 3 séculos após a morte de Buda. Criou-se um cânone e sobre esse cânone tomou-se a decisão de que nada mais entraria de novo, nenhum comentário a mais, e então pararam de adicionar informações.
Existe uma escola que conserva essa ideia de que só existe o cânone, então só se referem a ele e não consideram nenhum outro texto. É como se tudo o que precisassem estivesse ali.
Qual é a tendência mais natural de uma escola assim? É que o texto torna-se mais importante do que todo o resto. Então os textos são vistos como o repositório da sabedoria, e você sempre se volta para eles para tentar saber qual é a verdade. Não é diferente do que aconteceu com o cristianismo depois do congelamento da bíblia, que significa “os livros”. Tendo os livros todos reunidos no Concílio de Niceia, também congelaram as informações e não entrou mais nada. Havia mais de 40 evangelhos, mas apenas 4 foram escolhidos, e os outros foram descartados como apócrifos. Evangelho de Tomé, por exemplo, evangelhos vários com histórias que foram consideradas exageradas acabaram ficando de fora. Os 4 evangelhos selecionados compõem o que nós conhecemos hoje como a bíblia.
Qual é a atitude das pessoas diante disso? As pessoas abrem a bíblia e consideram aquilo a palavra de Deus, porque está escrita e aquilo é o certo, o que acaba criando conflitos, como aconteceu quando declararam que o sol era o centro do sistema solar e a Terra girava em volta dele. Acontece que no livro de Josué está escrito que Josué pediu a Deus que parasse o sol para que ele pudesse ganhar uma batalha, então surge o argumento de que se o sol parou, o que levou à interpretação de que é ele que gira em torno da Terra. Caso contrário ele teria pedido para a divindade parar a Terra. Hoje nós sabemos que isso causaria uma catástrofe gigantesca com enormes proporções.
Estou contando isso para que nós vejamos que o mesmo tipo de tendência fundamentalista também aconteceu no budismo. Uma vez eu conversei com um professor budista de uma escola que considera muito os textos e ele disse: “a sede da consciência é o coração”, e eu perguntei por que ele estava dizendo isso, e então ele respondeu: “porque no texto tal Buda disse isso dessa forma”. Mas isso é só o Sutra, é o conhecimento daquele tempo. Essa postura dele é uma postura fundamentalista, que diz que se está escrito lá desta forma então está certo.
[Trecho de Palestra proferida por Meihô Genshô Sensei]