Quem realmente somos | Monge Genshô

Quem realmente somos | Monge Genshô

Pergunta: Já que não existe essa visão pós-morte, o que a gente constrói acaba e a única coisa que temos é o nosso karma, as nossas ações?

Genshō Sensei: sim. Seu karma continua e o karma gera identidades. O karma que havia no passado gerou você, que hoje diz “eu sou”, que toma consciência de si mesma, mas você constrói essa consciência em cada momento da sua vida. Você muda tanto seu karma quanto a sua consciência nessa vida. Você muda sua apreciação sobre si mesma, quem você é, etc. É que quando a gente joga essa verdade, esse tipo de verdade, ela é chocante, porque não é isso que as pessoas querem, todo mundo quer que seu “euzinho” continue. Mas se você olhar isso de frente, existe outra coisa, muito grande, que é sua verdadeira natureza: se você tem uma visão iluminada e vê sua verdadeira natureza, essa sua verdadeira natureza não está sujeita a nascimento e morte. A sua verdadeira natureza é enorme, abrangente, não sujeita ao tempo. É como se você olhasse as ondas do mar. Se você olha as ondas do mar, elas se manifestam – nascem e morrem na beira da praia. Nós olhamos o mar e achamos o mar lindo, muito bonito. A nossa verdadeira natureza é mar. Nós pensamos como ondas e ficamos pensando: “eu nasço, morro… Onde é o paraíso das ondas? Onde é que eu continuo como onda?” – e nos sentimos arrasados pelo fato de morrermos, como se alguém fosse até a beira do mar e chorasse a cada onda que quebrasse: “que tragédia! Morreu a onda, morreu outra onda, outra”. Mas não é assim que olhamos o mar.

Se alguém olhasse a humanidade com os olhos que olhamos o mar, também acharia ridículo que alguém chorasse as nossas mortes, porque nós só somos continuidades dos nossos antepassados, de toda a vida na Terra há milhões de anos. Nós já somos um fenômeno muito privilegiado, temos até capacidade de falar sobre isso, o que já é extraordinário, já é mágico, mas nós queremos mais do que esse mágico já é. Se nós virmos a nossa verdadeira natureza, então estamos livres desse tipo de prisão de manifestações sucessivas e podemos compreender o grande universo.

Nós e o universo somos um, a Terra é uma com todas as vidas, como todas as vidas são uma única coisa conosco. Nós é que não estamos enxergando, nós ficamos presos querendo ser “eu”, querendo continuar, querendo explicações para quem somos, querendo saber qual é o nosso grande significado. Ideias como “meu”, “minha missão”, “eu quero saber isso” acontecem porque eu estou só olhando para o meu umbigo, então eu tenho uma visão minúscula, muito pequena. Se eu tivesse uma visão grande, eu veria o mar, não me olharia como onda e sim veria o oceano.

Nós somos tão tolos quanto o peixinho no mar, perguntando para o outro onde é que fica esse tal de oceano de que falam tanto…