Privilégios | Monge Genshô

Privilégios | Monge Genshô

Hoje e nos próximos dias uma onda de frio penetra o sul do país e as temperaturas caem rapidamente. Hoje em Florianópolis são 12°, mas daqui a dois dias chegaremos a 4° de mínima. Em alguns lugares pode nevar se houver condições para isso e isso me lembra que Akiba Roshi, que foi meu professor e abade em Yokoji, quando nevou e ficou muito frio ele disse para toda a sangha que estava muito feliz por aquelas condições.

Isso me faz recordar que os nossos ancestrais antes do Século XX não tinham as condições de aquecimento nem tão pouco luz elétrica, que sentavam na madrugada à luz de velas, com as cabeças descobertas e os monges não podiam usar luvas ou meias como é até hoje nos monastérios, nem aquecer suas cabeças raspadas e que não tinham as confortáveis condições que temos hoje.

Quando estive em Cuba vi uma sangha tão pobre que alguns não tinham zafus e a opção era conseguir uma pedra suficientemente chata para servir de almofada para sentar, então os praticantes assim sentavam, em cima de pedras. Somos profundamente privilegiados, mas talvez esse nosso privilégio nos torne fracos por não enfrentarmos dificuldades reais. Nosso único problema é o sono ou a preguiça para nos levantarmos cedo. Nosso único obstáculo é nossa vontade fraca, porque temos luz e aquecimento, zafus confortáveis e zabutons macios.

Tudo que temos que enfrentar são nossas mentes inquietas para sairmos do primeiro estágio da meditação, o da mente inquieta, para passarmos para dhyana, a  concentração, a calma. É necessário não afrouxarmos a nossa atenção em nenhum momento. Continuamente retornarmos para este lugar aqui e agora, sem nos comprazermos em nossas viagens de pensamentos para o passado ou para o futuro. Só assim teremos a oportunidade de ir mais longe e conseguirmos uma concentração profunda, uma mente límpida, sem cogitações, chegarmos ao samadhi.

Agradeçamos então, como diz Akiba Roshi, as condições difíceis, agradeçamos o frio, agradeçamos tudo aquilo que reforça a nossa vontade.

Teishô Matinal proferido por Meihô Genshô Sensei, Junho-julho/2021.