Perguntas e Respostas - Palestra Pública Goiânia (Parte III)

Perguntas e Respostas - Palestra Pública Goiânia (Parte III)

Aluno: O senhor falou que praticando o método podemos alterar o carma.

Monge Genshô: Sim e para isso não precisa usar um método budista, qualquer coisa que você fizer bem e para o bem altera o seu carma. O budismo não é o dono da verdade é apenas um método, ele não tem a razão absoluta e nem considera que os outros estão errados.

Aluno: A prática Zen se faz sentado. Mas quando eu me sento, me sento com uma motivação. Essa motivação não gera carma? Há a possibilidade de sentar sem motivação?

Monge Genshô: Sim e é assim que deve ser. A palavra shikantaza quer dizer apenas sentar-se. Você não deve sentar para procurar a iluminação porque essa é uma mente aquisitiva. Quando você senta para meditar tem que apenas sentar. Só que no início os praticantes de qualquer escola budista praticam por quê? Porque a vida não está boa. A pessoa vai lá ao centro Zen procurando algo e então ela quer algo para si, quer serenidade, calma, etc. Mas ela vai descobrir, logo que der alguns passos, que não tem sentido fazer aquilo. Então o melhor momento é quando eu pergunto para o aluno por que ele continua praticando e ele diz: “não sei mais”. Nesse ponto ele perdeu as motivações materialistas iniciais.

Se alguém chega no centro Zen e pede para que eu abençoe a carteira para ter dinheiro e conseguir trabalho eu digo: “faça o seguinte, traga o seu currículo junto com a carteira”. Pego o currículo, leio, corrijo, “mas e a benção?”, perguntam, e eu digo: “não, tem que corrigir primeiro e depois fazer uma lista de lugares onde você pode trabalhar”. “Mas e a benção?”, não tem benção, não tem mágica, por isso monge Zen tem que trabalhar.

Aluno: Nosso carma é fruto do que fizemos no passado, mas o que fizemos agora também gera carma. Mesmo que não façamos nada, alguém vem e faz algo conosco e isso também gera carma. Até quando vai esse ciclo?

Monge Genshô: É um problema grande, não é? Você teria que não reagir, apenas aceitar o que vem. Não significa aceitar a violência e a injustiça sem protestar e sem tentar mudar a sociedade. Não é isso. Até porque isso também geraria carma, você tem que mudar para que as coisas não se repitam e para que outras pessoas também não sejam vítimas do mesmo mal. Mas veja quanto a humanidade tem que melhorar, você sabe quantos anos nós temos de história escrita sem guerra? 300 anos de paz. Sempre depois de uma guerra, passam três ou quatro anos e surge uma nova. Então a humanidade tem muito carma de maldade e de violência, isso é maior do que a gente imagina. Você precisa primeiro saber disso e em segundo lugar reagir contra para que outras pessoas não sejam vítimas do mesmo tipo de coisa. Você precisa tentar influir para que a sociedade mude e quanto tempo isso vai levar? Um tempo imenso. Eu passei um período no Japão este ano e eu vivi lá uma outra realidade, por exemplo, quantos assassinatos temos por ano no Brasil? 58 mil, o que dá 160 por dia. O Japão já foi um país assim, mas ele lutou contra, eliminou armas e etc. Hoje há quantos assassinatos no Japão por ano? Entre 4 a 6, por ano. Isso fazemos por hora no Brasil. Então uma sociedade diferente é possível.

Aluno: Isso é uma mudança cármica?

Monge Genshô: Sim. Custou um trabalho imenso e muito tempo, durou 300 anos, mas foram anos em que o Japão se firmou como país pacífico. No fim do século XIX houve uma restauração do imperador que era xintoísta, então combateu-se o budismo  e quem passou a comandar foi o xintoísmo que fazia do imperador uma divindade. A partir disso criaram um exército, então foi se desenvolvendo a vontade de aumentar o império e para isso foram feitas guerras, houve a invasão à Coreia e aconteceram atrocidades horrorosas em vários locais e durante a Segunda Guerra Mundial. Tudo isso acabou levando a certos resultados. As bombas atômicas não foram muito comparado com o que aconteceu durante os bombardeios incendiários que criaram tempestades de fogo, já que as bombas eram feitas de fósforo. 70% das casas do Japão inteiro foram destruídas nesses bombardeiros porque eram feitas de madeira e mesmo que você jogasse areia ou água o fogo não apagava. Morreram 120 mil pessoas em duas noites com bombardeios de fogo em Tóquio. Cidades inteiras foram destruídas e o pior é que isso não tinha efeito. Tinha efeito bombardear fábricas e não casas, mas isso não impediu que bombardeassem as casas também. Isso tudo tem um enorme carma, mas hoje, devido a séculos de disciplina ética, se você deixar um notebook num banco de uma praça no Japão e voltar no dia seguinte para buscar, ele continuará lá e talvez tenha até mais aplicativos (rsrsrsrs). Então é realmente incrível esse lado civilizatório. Tem coisas muito ruins, claro. A sociedade, por exemplo, faz uma pressão tão grande sobre as pessoas que ocorrem 30 mil suicídios por ano.

(continua…)