Para sermos felizes

Para sermos felizes

Pergunta: – (…) E se a pessoa não se controla e provoca um turbilhão porque não soube ficar suficientemente quieta no momento para poder ver o que havia de bom na situação. Ela gera um carma ruim, isso é provocado pelo ego. O que fazer quando esse tipo de situação ocorre?
Monge Genshô: – Você sempre pode parar, respirar, pedir desculpas. Você pode se dar conta e pode dizer, “Estou muito nervoso, estou falando coisas que não deveria, desculpe-me”. Você sempre pode parar, sempre pode dar-se conta. Se você praticar zazen tempo suficiente, quando acontecer alguma coisa que possa criar uma situação desarmoniosa, você pode olhar para ela e ver como ela realmente é, e você já se acostuma a ela. Por isso eu digo que as coisas materiais são até fáceis, se você se acostumar a pensar: “Ah, quebrou um copo, e daí, é só um copo”. O que a gente faz quando se quebra um copo? Junta os cacos. É completamente errado repreender uma criança apenas porque derrubou algo da mesa e quebrou. Os adultos fazem a mesma coisa e ninguém grita com eles. O que é certo? Ensinar. Se a criança quebra algo, ensinamos a ela como juntar os cacos: pegamos a pazinha e vamos juntar os cacos quebrados. Mas você não vai ficar brabo? As coisas quebram. Se você ficar chateado porque as coisas quebram, você irá perder de vista a vida. Não vale a pena. Não vale a pena nenhum desespero por coisas materiais. 

É claro que a gente pode se preocupar, pois às vezes chega-se a um ponto em que as coisas ficam críticas. Por exemplo, se não pagarmos a conta da luz, a eletricidade será cortada. Thomas Edison tinha um grande laboratório com, mais ou menos, dez mil patentes. Um dia o laboratório pegou fogo. Então, ele acordou toda a família e a levou para verem o laboratório arder em chamas. Então sua mulher perguntou-lhe: “Mas por que você está assim, se seu laboratório está pegando fogo?”. E ele respondeu, “Vocês nunca verão uma fogueira como essa!” Como ele já estava imaginando um novo e melhor laboratório, evitando os mesmos erros do primeiro, ele transformou aquilo em alegria. As coisas podem ser vistas de formas diferentes. Claro, com coisas materiais é bem mais fácil.
Aluno: – Pode ser visto como um incentivo, por exemplo, no laboratório velho era difícil para ele progredir. Estava atrapalhando.
Monge Genshô: – Isso. Mas se ele dissesse: “Como eu gosto dessas coisas, elas não podem ser perdidas”, então ele sofreria. Mas já temos sofrimentos legítimos muito grandes na vida. Às vezes surgem pessoas com câncer – isso é sofrimento de verdade, porque dinheiro não resolve – ou com outros problemas que o dinheiro não resolve. Uma boa maneira de ver as coisas é se perguntando se o dinheiro resolve. Se a resposta for afirmativa, então não é problema de verdade. Problema de verdade é quando a gente diz “não, dinheiro não resolve”. Então a pessoa chora e o que resta ao monge é chorar junto, porque, nesse caso, é sofrimento de verdade e não tem uma solução fácil, porque precisaria esquecer a própria vida para superar aquilo e somos pessoas frágeis.
Então, devemos deixar o sofrimento para essas coisas realmente importantes, realmente definitivas. Hoje uma atriz se jogou de um edifício em são Paulo. Em janeiro o noivo dela havia se suicidado assim, e ela não conseguiu superar esse acontecimento e fez a mesma coisa. Mesmo que se reconheça o sofrimento e a dificuldade disso, tal solução não é correta, porque mesmo o sofrimento afetivo passa. O tempo passa e o sofrimento passa junto. 

Minha mãe perdeu vinte irmãos, o pai e a mãe dela, dois maridos e quatro filhos. Ela enterrou todos eles. Ela acreditava na vida, pois morreu com noventa e sete anos. Mesmo depois de morrerem os quatro filhos, ela tentou de novo e teve quatro filhos que sobreviveram. E ela se lembrava destes; tinha memória do passado, mas a felicidade da sobrevivência era suficiente para mantê-la feliz. Ela sempre dizia: “sou muito feliz!”. É uma questão de como você vê as coisas. Se a atriz tivesse deixado passar um pouco mais o tempo, talvez tivesse encontrado um novo amor, talvez tivesse reconstruído sua vida. Não existe uma justificativa para a desistência. O que aconteceu é memória, mas ela não nos serve. Por isso, quando sentamos em zazen temos que jogar fora a memória. Para ficarmos felizes não podemos carregar memórias negativas.