O Terceiro Elo – Parte 2 | Monge Genshō

O Terceiro Elo – Parte 2 | Monge Genshō

[CONTINUAÇÃO]

Porque o “eu” não pode sobreviver à perda da memória. Quando perdemos a memória, não sabemos mais quem somos. Isso é essencial nos casos de amnésia, ou no momento em que você está desmaiado, inconsciente ou anestesiado. Você não sabe quem você é. Quando surge de novo a consciência, então você recupera a identidade, acordando de um momento de inconsciência.

Mesmo que esse momento de consciência dure dez anos, vamos supor… que você esteja em coma… você acorda dez anos depois… terá que ser informado sobre o que aconteceu, quem você é, o que você foi… mas você não sabe nada sobre esses dez anos. Você acorda com a consciência, com a memória… se acordar assim… com a memória dos últimos momentos de consciência que você teve.

Então, fundamental é compreendermos que o “eu” não existe. Esse fenômeno de termos consciência de um eu só existe enquanto estamos acordados e enquanto temos memória. O que pode permanecer de nós? O karma.

O karma e suas marcas ficam conosco e pode ser até que, por um fenômeno que não entendemos ainda completamente, crianças pequenas tenham uma memória de vidas passadas, mas que a partir da formatação do cérebro pelos quatro anos, ela se perde completamente.

Então, mesmo que haja laivos de lembranças, por, como eu disse, fenômenos que não compreendemos inteiramente ainda, o eu de cada vida é um novo eu, porque a memória que se sustenta, que permanece conosco, é a deste momento. Vijñāna, portanto, consciência, surge a partir da memória e surge a partir do contato, das percepções sensoriais.

Essa consciência é construída por nós e é construída de maneiras muito sutis. Nós, por exemplo, podemos ver os emojis. Eles são uns exemplos disso. Nós vemos um emoji, que é um círculo, com dois pontos e um traço abaixo. Nós imediatamente identificamos os dois pontos como olhos e o traço abaixo como uma boca. Se ele for curvado para baixo, parece triste. Se para cima, parece que sorri.

E essa é uma interpretação nossa, com pouquíssimos dados. Então, a emoção expressa pelo emoji é construída pela nossa consciência e pela nossa memória das expressões humanas. Nós ligamos aqueles pontos e aí os interpretamos de uma determinada forma.

Isso faz com que nós vejamos uma emoção no emoji, mas evidentemente ele é muito pobre em informações. Toda emoção é construída dentro da nossa visão e da nossa memória das expressões humanas. Porque temos memória, interpretamos aqueles poucos dados e os reconstruímos dentro da nossa mente vendo uma coisa que evidentemente não está lá. É tudo reconstruído dentro da nossa mente.

O importante, então, na compreensão desse elo, a consciência, é que ele surge a partir das marcas do Saṃskāra, das marcas do karma que nós temos, e as nossas interpretações são influenciadas por elas. De modo que nós, seres humanos, vemos determinadas coisas que só os seres humanos veem, por causa da sua intimidade, da sua partilha com outros seres humanos, dos mesmos símbolos visuais.

Nós os vemos assim, mas a interpretação está dentro da nossa mente, da nossa cultura. Por isso vemos um sorriso no traço curvado para cima. Um outro ser que não partilhe do mesmo corpo e do mesmo tipo de memória, de marcas que os seres humanos partilham, não verá o mesmo significado naquele símbolo.

Isso não é absoluto, tanto que podemos ver cães que aprendem a sorrir ao contrato com seres humanos. E isso significa que nós conseguimos até partilhar algo com outros seres que têm um pouco de consciência semelhante à nossa. De certa maneira, são nossos parentes, são mamíferos. Houve tempo no passado em que partilhamos os mesmos ancestrais. É um tempo remoto, mas permanecem coisas que nós partilhamos.

[CONTINUA]


Palestra proferida por Genshō Sensei em teishō na Daissen Virtual em maio de 2024.