Pergunta: Monge, é normal que o tempo de meditação demore muito em alguns dias e em outros seja rápido?
Monge Genshô: (risos) Isso depende demais, depende do zazen que você está fazendo: às vezes, ele demora muito, e às vezes é muito rápido. Você não sabe muito bem, é bom que você não tenha relógio, não olhe. Eu recomento a vocês que guardem seus relógios, que desliguem seus celulares, nós não temos conexão aqui mesmo. Quanto mais você se senta com menos considerações, mais rápido será, e você pode perder a noção do tempo.
Uma vez, acho que em Paulo Lopes, nós estávamos fazendo um retiro, um Sesshin, e chegou um momento que nós ultrapassamos os tempos de uma atividade. Há uma pessoa que regula o tempo, que é quem está com o sino, então se ultrapassamos o tempo em alguma atividade essa pessoa encurta um zazen para acertar. Nesse Sesshin, eu chamei esta pessoa e disse: “nós estouramos o tempo aqui, então faça um zazen de cinco minutos, para que a gente prossiga na programação do Sesshin”. Fomos lá, sentamos, ela marcou cinco minutos e tocou o sino. Quando estávamos fazendo as entrevistas depois, veio um rapaz e disse: “Monge, ontem teve um zazen que foi impressionante para mim, eu me sentei e ele acabou”. (risos) “Perdi completamente a noção do tempo”. Eu não disse nada, não expliquei o que tinha acontecido para aquele rapaz, porque ele estava tão encantado com o que aconteceu, que talvez até fosse útil. Então, eu também não posso saber qual a sua sensação a respeito do tempo. Depende demais do ritmo da sua mente. A noção de tempo é completamente ligada à atividade cerebral. Para quem já fez uma cirurgia, foi anestesiado, no momento em que você desmaia e o momento que você acorda pode ter durado três horas, mas para você parece que foi no mesmo instante praticamente. Por isso, algumas vezes as pessoas perguntam: “se eu morrer, quanto tempo leva para eu renascer?”- essa pergunta não tem sentido, pois o tempo, quando não há atividade cerebral, não existe.
Tempo, aqui para nós, é uma simples questão de percepção, e você não quantifica o tempo nesse sentido. Nós estamos falando aqui e agora, e daqui a pouco o Sesshin vai acabar, domingo. Eu acabo, naturalmente, fazendo muitos Sesshins, às vezes dois por mês, e quando um Sesshin começa, eu sei que ele vai acabar, porque todos os Sesshins acabam. Todo tempo começa e acaba. Tudo é assim, todas as viagens começam e acabam. Tudo que acontece, nada permanece, tudo muda de forma impressionante. Você tem um casamento e se separa, começa outro relacionamento, de repente a memória anterior se esvaneceu, como se fosse de outra vida, como se não tivesse existido, você tem apenas memórias, como se fosse a vida de outra pessoa. Não é mais sua vida, sua vida é aquela, só existe uma vida real, a deste momento. Passado é memória, futuro é imaginação, então só existe agora.
Você tem que levar essa percepção do tempo para o zazen, você se senta em zazen e tem que saber que este é o único momento que existe, o resto todo só existe como registro mental, na sua cabeça é passado, memória. Futuro é o que você espera que aconteça. Só existe um instante real: o agora. Portanto, todo o tempo está contido em um único ponto, todo passado está contido neste agora, e todo futuro, que é potência, está contido neste agora. O tempo é um ponto, não é um transcorrer, não é uma linha de presente que corre sobre uma linha que tem passado e futuro, não é assim. O tempo é um ponto. Nós pensamos que o tempo vai e vem, mas ele não vem e nem vai.
Eu gosto muito da história do Monge que estava morrendo e um Mestre chega ao lado e pergunta: “posso lhe ajudar?” e o Monge diz: “se não há nenhum lugar para ir, como o senhor pode me ajudar?” e o Mestre diz: “se você pensa que vem ou vai, ainda está muito enganado”.
A noção de tempo ou espaço estão hodiernamente ligadas, na Física mesmo: espaço-tempo formam um conjunto. No tempo newtoniano, funcionava como uma linha que transcorre e que divide passado e futuro, mas no conceito budista, e essa descrição de Dogen já tem 800 anos. O tempo é como um ponto, e por isso não há nem ir, nem vir. Isso também está contido num título usado para nos referir a Buda: Tathagata, que significa “aquele que não vem e nem vai”.
Não há como sair daqui, e se você compreender que não vem e nem vai, então perceberá que nascimento e morte são ilusões temporais, não existe um ir e um vir. Se você se sentar lá em zazen e ficar realmente com uma mente pacificada, essa noção de ir e vir também desaparecerá. Todas essas angústias humanas sobre passado e futuro também se desvanecerão. Por isso é tão importante levar a mente a outro estado, que é esse estado em que você compreende aqui, agora, seu aprisionamento sobre si mesmo, suas noções sobre passado e futuro, seu medo da morte – todas essas coisas dependem de uma determinada visão; uma visão a qual você está condicionado, mas que é tão estreita quanto a visão da rã no poço.