O Sermão de Huineng - Parte VII | Monge Genshô

O Sermão de Huineng - Parte VII | Monge Genshô

(…) “Mas os seres cuja mente está cega pelas paixões e as opiniões errôneas buscam ao Buddha por meio de práticas exteriores e nem sequer aspiram a reconhecer sua verdadeira natureza”.

Aqui há uma referência a um axioma para nós que uma das dificuldades para despertar é o apego aos ritos e cerimônias. Os usamos como auxiliares da prática, mas eles não são o centro da prática e nem a possibilidade de despertar está neles.

A possibilidade de despertar será construída através de uma prática pessoal que é zazen. O que significa que você tem que fazer um esforço pessoal, no qual o mestre não pode ajudar.

Ele pode apenas sentar junto. Sem uma prática diária não é possível que você ambicione algum despertar.

Voltando ao final do ensinamento de Huineng: “se escutasse o ensinamento do despertar súbito e o pusesse em prática, inclusive os seres mais obtusos, despertariam todos no mesmo instante. Não tenhais morada interior ou exterior. Ide e venham com toda liberdade, rechachai somente de vossa mente aquilo a que ela se aferra, que vossa penetração não encontre nenhum obstáculo. Quando a vossa mente se haja exercitada nesta prática já não existirá fundamentalmente nenhuma desigualdade entre vós e a grande sabedoria que conduz a outra margem”.

Assim Huineng encerrou seu sermão.

Essa profundidade do sermão de Huineng mostra praticamente diferença alguma sobre o ensinamento como é dado hoje. Estamos aqui agora a 1.300 anos do momento em que ele falou e é claro que os apegos e as aversões continuam produzindo a infelicidade no mundo, as ambições desregradas, homens perdidos em sua ganância.

Estamos vendo agora uma guerra causada por um desejo territorial, imperial e enormes sofrimentos sendo causados e todos eles são causados por essa ignorância, falta de compaixão, cegueira. ontem estava comentando com minha filha que mora no Rio de Janeiro e que gosta muito de literatura sobre um livro antigo “A velhice do padre eterno” e nele há um poema “A caridade e a justiça” e um trecho magnífico em que Judas, o traidor, encontra o remorso e o remorso é um vulto de gigante. Citarei o trecho.

Ele diz:“quem és tu?” e o gigante responde “sou o remorso, um caçador de feras, há mais de dois mil anos ando no mundo a caçar as almas dos tiranos, dos vis, dos celerados e depois de os prender, tenho-os encarcerado na enormíssima jaula atroz da expiação e quando entro ali há imensa confusão de tigres, abutres, chacais, de rugidos febris e gritos bestiais. Caim baixa a pupila e vai deitar-se a um canto e eu dou-lhe um pontapé como em um cão mendigo. Vem, Judas, anda comigo.”

Judas tenta entregar dinheiro para ele e o remorso responde: “não, Judas, guarda este ouro, que quero derretê-lo e pingar-to gota a gota na tua consciência pútrida e execrável durante toda a eternidade ilimitada e calma”.

Pulei vários trechos, o poema é mais longo, mas os homens que causam grandes sofrimentos não poderão escapar do karma provocado por si mesmos e esse poema é da tradição ocidental e cristão, mas dentro dele tem a mesma coisa.

O tempo é extremamente longo para aqueles que causam grandes sofrimentos.

Teishô proferido por Meihô Genshô Sesnei, Daissen-virtual, março/2022.