O Oitavo Elo – Parte 3 | Monge Genshō

O Oitavo Elo – Parte 3 | Monge Genshō

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Então seria uma violência nossa tentativa de convencer uma pessoa a voltar a pertencer a Sangha, ou a praticar. Ela é que tem que fazer esforço para seguir o Caminho, para praticar, para pertencer a Sangha.

Portanto, Tṛ́ṣṇā, a ânsia, é transformar nossas escolhas em vícios, em necessidades, em coisas que se tornam imperiosas para nós, e é uma forma bastante forte das cegueiras que assaltam os seres humanos.

Praticante: Estou presenciando um ambiente bastante tóxico no trabalho. Venho tentando através de feedback mudar essa postura. E, apesar de perceber uma melhora, ainda sinto esse mal refletido em minha saúde, com sintomas de estresse, necessitando inclusive ir a um médico. Se possível, o senhor poderia fazer uma observação nesse sentido?

Genshō Sensei: Na realidade ele coloca sobre um cliente que fala em termos de baixo calão, críticas desmotivadoras, etc. Existem duas atitudes básicas que podemos tomar em relação a pessoas desagradáveis ou com condutas que são destrutivas. Uma conduta é dizer que não estou apreciando isso, eu acho que não podemos ter uma relação de trabalho desta forma. E a outra é, no limite, você simplesmente dizer, nós não podemos mais trabalhar assim.

Eu trabalhei como consultor, em inúmeras empresas, e em duas ocasiões eu disse ao cliente “não posso trabalhar com o senhor”. Eu acho que fomos até onde seria possível, mas a partir deste ponto aqui, eu não posso mais trabalhar. O senhor tem que procurar outra pessoa para lhe ajudar, porque dentro dos meus critérios pessoais, é impossível nós prosseguirmos, dadas as nossas diferenças de perspectiva.

E eu acho que nós temos que ter coragem de fazer isso. Quando nós fazemos uma coisa como essa vem uma grande sensação de alívio.

Praticante: O desejo de desenvolver-se na prática pode ser benéfico?

Genshō Sensei: Com certeza. Foi o que eu tentei dizer no início. A palavra “desejo” em português, ela parece ter uma conotação negativa, mas não é verdade. O desejo de ajudar os outros é um bom desejo. O desejo de se desenvolver na prática é um bom desejo. Agora, se você transformar esse desejo, numa ambição de se tornar um santo, melhor que os outros, mestre, ensinar, isso vai ser péssimo.

Um dos maiores problemas que ocorrem dentro do Zen, é quando um aluno deseja uma proeminência qualquer. Nesses tempos, nós tivemos um aluno que nunca tinha feito um Sesshin, nunca tinha praticado, mas ele comunicou que queria ser monge. porque não havia nenhum monge na cidade dele e ele queria ensinar. Ele queria ensinar, porque isso lhe daria mais prestígio, ia ajudar a Sangha e tudo mais.

É uma perspectiva completamente errada. Ninguém vai conseguir a aprovação para ser monge se não estiver praticando há bastante tempo, ter se mostrado muito dedicado, muito esforçado, para com os outros, mas não por nenhuma ambição pessoal, ou de preeminência, ou de querer que os outros lhe façam reverências, ou coisas assim.

Então, esse desejo aparentemente bom é mau, porque na realidade é o desejo de aparecer, de se destacar, que não vai dar certo. Logo a seguir, depois de algum tempo como monge, ele vai desistir, porque vai descobrir que só lhe caiu em cima uma quantidade imensa de trabalho, de esforço, de exigências, que só tem sentido para alguém que deseja se dedicar aos outros sem limites. Sua vida profissional será prejudicada, sua vida familiar será prejudicada. Ser monge não é uma coisa fácil. Trata-se de dedicação absoluta.

Portanto, desenvolver-se na prática pode ser benéfico. Mas se for com objetivos de grandiosidade pessoal, vai dar muito errado.

[CONTINUA]


Palestra proferida por Genshō Sensei em teishō na Daissen Virtual no ano de 2024.