O lugar de descanso

O lugar de descanso

JOKO: Sim. Não podemos nos aborrecer, a menos que nossa mente nos tenha removido do presente e levado para pensamentos irreais. Sempre que estamos contrariados estamos literalmente “de fora”: deixamos algo de fora. Somos como um peixe fora d’água. Quando estamos no presente, plenamente conscientes, não conseguimos ter uma idéia do tipo: “Oh, essa vida é tão difícil. Tão sem sentido!”. Se fazemos isso, deixamos
alguma coisa de fora. Só isso! Um bom aluno reconhece quando se distanciou e retorna à vivência imediata. Às vezes apenas balançamos a cabeça e restabelecemos a base de nossa vida, os alicerces da vivência. Desses alicerces brotam pensamentos, ações e uma criatividade perfeitamente adequados. Tudo isso nasce desse espaço da vivência, em que o sentidos simplesmente se encontram abertos.
Quando estava com dezesseis, dezessete anos eu gostava de tocar os corais de Bach no piano. Um que me agradava em especial era chamado “Em Teus Braços Eu Me Descanso”. A tradução prossegue assim: “Os inimigos que me atacariam não conseguem encontrar-me aqui”.
Embora seja da tradição cristã, em geral dualista, esse coral trata do estar presente e desperto. Existe um lugar de repouso em nossas vidas, um lugar onde devemos estar para podermos funcionar bem. Esse lugar de descanso – os braços de Deus, se quiserem chamá-lo assim – é simplesmente aqui e agora: ver, ouvir, tocar, sentir odores e sabores, sentir a vida como ela é.
Podemos até acrescentar “pensar” a essa lista, se entendemos o pensar como apenas o funcionamento natural e não como as reflexões do ego que se baseiam em medo e apego. Apenas pensar, no sentido funcional, inclui o pensamento abstrato, o
pensamento criativo, ou planejar o que temos para fazer hoje. Com excessiva freqüência, porém, acrescentamos pensamentos não funcionais, baseados no ego, que nos levam às dificuldades e nos retiram dos braços de Deus.»
Charlotte Joko Beck