1) Esse abandono do eu e do ego e a vontade da vida, isso fica um pouco confuso…
Monge Genshô – É porque pensamos que o “eu” é que vive. Mas não é o “eu” que vive a vida. A vida é que nos vive. Nós somos a própria vida. Não é um “eu” que está vivendo a vida. Não é uma folha numa árvore lá fora que está vivendo a floresta, é a floresta que produz folhas. Nós somos a própria floresta, não somos folhas. As folhas nascem e morrem. Seria muito tolo que uma folha se sentisse muito infeliz porque amarelece e cai, nós diríamos que a folha é tola, pois torna-se húmus, nasce de novo, ela é a própria vida, não há nenhuma tristeza nas folhas que caem das árvores.
Ninguém chora as folhas que caem no outono, pois nós sabemos que a vida produz primavera, mas quando olhamos para nós mesmos, confundimos o “eu” com a vida, nós pensamos que é o “eu” que vive a vida, e não é isso. A vida é que nos vive. Somos a própria vida. E por isso, porque a vida está sempre continuando, nascimento e morte também são ilusões. Não há como você ir embora daqui, você é a vida. Então esse seu “eu” temporário é só um evento extemporâneo da vida como um todo.
É como o quebrar da ondas do mar, como as folhas que caem e viram húmus, é como as nuvens que chovem. Se uma nuvem vira água e chove ninguém diz – “Coitadinha da nuvem, virou chuva” – nós sabemos que a chuva cai, que as plantas crescem por causa disso, que nós vivemos por causa disso, um dia evapora e volta a ser nuvem. Não damos nomes às nuvens e dizemos que elas têm identidades e não dizemos – “Lá vai a nuvem Joana, coitada, vai morrer hoje pois esfriou e ela vai chover até se acabar” – só fazemos isso conosco e isso mostra nossa cegueira.