Libertando-se de mágoas | Monge Genshô

Libertando-se de mágoas | Monge Genshô

A cada instante, reconstruímos nossa noção de nossa própria existência através dos nossos pensamentos e das nossas percepções mentais que criam a consciência. 

Muitas pessoas levam durante a vida marcas ocasionadas por acontecimentos da infância, por memórias dos seus pais, por recordações das mais diversas. Mas a única coisa que sustenta esses acontecimentos é a lembrança, a memória. Aquelas pessoas do passado, mesmo vivas hoje, não são mais as mesmas, mudaram. Mudaram seus corpos, mudaram suas mentes. Nós as olhamos como se fossem as mesmas, mas não são. Por isso, aqueles que se libertam das lembranças têm mais facilidade em perdoar, têm mais facilidade em esquecer.

É extremamente libertador que a cada vida percamos completamente a lembrança, a consciência da memória de vidas anteriores. Mas, ao fazermos zazen, temos uma outra oportunidade: a de esquecer de nós mesmos e descartar nossas memórias. Sentados em zazen podemos desligar. E se desligarmos nossas memórias e ficarmos no momento presente, se desligarmos nossas expectativas sobre o futuro e ficarmos realmente no momento presente, um espaço de pura liberdade, de perdão e de limpeza surge. Então, temos a capacidade de apagar o passado. Compreender que essa liberdade é possível traz uma luminosidade clara, um contentamento, uma alegria na própria existência. Compreender a mudança é abraçar a impermanência como a magnífica solução, pois ela permite libertar-nos de todas as mágoas. 

Assim, devemos encarar cada vida como uma oportunidade. E, se conseguirmos levar esse espaço de esquecimento para nossa vida presente, podemos tornar cada dia um dia novo, liberto de todas as cargas passadas. Isso só pode ser realizado com a verdadeira reforma em nossa mente através do zazen. Nenhum conhecimento, elaboração ou pensamento tem esse poder. Só o zazen tem essa possibilidade, essa capacidade.

Então, em primeiro lugar, entendamos: não existem as pessoas do passado, elas mudaram, são outras; nós podemos mudar, somos outros; nossas memórias podem ser consideradas como as memórias de outra pessoa. Nós podemos adquirir o sentimento de libertação através desta limpeza de nossa mente. Começamos compreendendo profundamente a impermanência, a mudança, o fato de o passado poder ser erodido e o espaço do novo estar à nossa frente com uma mente limpa, luminosa e liberta.

Teishô Matinal proferido por Meihô Genshô Sensei, março/abril de 2021.