Pergunta: Vamos desaparecer quando atingirmos a iluminação?
Monge Genshô: Está no Sutra do coração “san myaku san bodai”, que quer dizer: iluminação completa, perfeita e universal. Essa iluminação é a extinção completa da noção de um eu. É a resposta de Bodhidharma. “Quem eu tenho na minha frente?” e ele responde: “não faço a menor ideia”. Então, nesse caso não existe um eu que se ilumina mais, porque justamente essa iluminação completa é a extinção da noção de um eu.
Pergunta: Treinamos para desaparecer?
Monge Genshô: De certa forma sim. Quando nós estamos treinando estamos treinando para atingir esse ponto, mas não há nenhuma garantia de que você vá atingi-lo no próximo milhão de anos. Alguns atingem a iluminação e na realidade são bem poucos. Perguntaram para Shunryu Suzuki quantas pessoas ele conhecia que eram perfeitamente iluminadas, quantos Mestres no mundo todo e ele respondeu: “não mais que uma dúzia”. Então, num momento como agora, quantos Mestres iluminados estão ensinando? Muito poucos.
Então, praticamos para atingir a iluminação, mas ela tem muitos graus. Iluminação em graus baixos é compreender, mas ainda não agir de forma iluminada. Um grande Mestre, dividiu em quatro níveis a iluminação e o último nível ele denominou “da ação”. Quando alguém tem atos que refletem a iluminação, quando cospe e essa é uma cuspida iluminada, essa é a iluminação completa. Há uma história antiga de uma mulher que vinha numa floresta e achou um Monge evacuando, era Shariputra, grande discípulo de Buda, ela o viu evacuando e ele tinha um tal ar de dignidade que ela achou aquilo muito diferente dos seres humanos normais e imediatamente largou tudo, foi até Buda e pediu para ser discípula como Shariputra era, porque ela queria ser daquele jeito. Esse nível, quando passa para a ação, para a vida, para a maneira como fala, esse é um nível realmente mais alto de iluminação. A gente já reconhece uma realização espiritual no entender, mas ela ainda não se expressa em todos os nossos atos, às vezes está presente e às vezes não. Praticamos para andar mais rápido, mas é como eu disse: não há nenhuma garantia que nos próximos anos iremos nos iluminar. Não existe uma garantia nesse sentido. A permanência na ignorância pode ser muito vasta.
Uma vez eu estava vendo uma palestra do Nizan Guanaes, um publicitário, e ele disse uma frase que fez todos darem risada: “vocês já notaram que a inteligência tem limite mas a burrice não tem?”. A gente tem que levar em conta que não praticar é perder muito tempo. Por isso há aquela frase: “praticantes, vida e morte são assuntos muito importantes, por isso vos peço, encarecidamente, não percam tempo”. Porque a vida é curta, breve e você perde tempo. O que acontece com quem perde tempo? Repete outras vidas, sem a memória dessa, só com os mesmo impulsos. Quando olho para a minha própria vida vejo quantas mancadas com sérias consequências cometi. Se eu voltar com os mesmos impulsos originais, vou cometer o mesmo tipo de mancadas, vou cometer os mesmos erros e é muito fácil isso acontecer quando somos guiados só pelas emoções. As emoções são más conselheiras. Aquela frase “siga seu coração” está errada. Não é para seguir seu coração, é para seguir o caminho óctuplo. Se você seguir seu coração, vai ser arrastado pelas suas paixões e se isso acontecer você vai destruir sua vida. Às vezes você começa a fazer uma obra maravilhosa, vários Monges passaram por isso, começam tudo bem, se sacrificam durante muitos anos para chegar naquele ponto e então surge a oportunidade de uma paixão e eles jogam fora toda a vida, todos aqueles anos de trabalho. Nesse momento a oportunidade de ser exemplo na vida acaba. Isso é muito complicado e mais frequente do que imaginamos. As paixões não são boas, temos que parar e pensar sobre as repercussões dos nossos atos, trabalhos e vida a longo prazo. O que poderá acontecer a partir de uma iniciativa minha? Isso tem que ser pensado.