(continuação, Sermão de Bassui sobre a Mente Una)
“Num sonho você poderá perder-se e não saber mais o caminho para casa. Você pede a uma pessoa que lhe indique como voltar ou você reza a Deus ou a Buda que o ajude, mas mesmo assim não consegue voltar para casa. Logo que sai do estado de sonho, porém, descobre que está na sua própria cama e compreende que o único meio que teria para voltar a casa, seria o de acordar-se. Esta (espécie de despertar espiritual) é chamada “volta à origem ou renascimento no paraíso”. É a forma de percepção interior que se pode conseguir com algum treinamento. Virtualmente todos os que gostam do zazen e se esforçam na sua prática, sejam leigos ou monges, compreenderão até este grau. Mas mesmo esse despertar (parcial) não pode ser conseguido, exceto pela prática do zazen. Você estaria porém cometendo um grave erro, se achasse que isto foi uma verdadeira iluminação na qual não há dúvida alguma sobre a natureza da realidade. Seria como um homem que, tendo encontrado cobre, abandonasse o desejo de procurar ouro.
A respeito dessa percepção, questione-se sempre mais intensamente desta maneira: “Meu corpo é como um fantasma, como bolhas num riacho. Minha mente olhando-se intimamente,é tão informe quanto um espaço vazio, ainda que em alguns lugares dentro dela sejam percebidos sons. Quem está escutando?” Se você questionar-se desta forma com profunda absorção, nunca diminuindo a intensidade de seu esforço, sua mente racional acabará por se exaurir e somente o questionamento no nível mais profundo permanecerá. Finalmente, perderá a consciência do seu próprio corpo. Suas idéias e concepções há muito tempo sustentadas, extinguir-se-ão depois do absoluto questionamento, da mesma forma que cada gota de água desaparece de um barril com o fundo arrombado, e seguir-se-á a perfeita iluminação, como flores que se abrem repentinamente nas árvores secas.
Com essa percepção você conquista a verdadeira emancipação. Mas, mesmo agora, abandone sempre de novo o que foi compreendido, voltando-se para aquilo que compreende, isto é, para a raiz mais profunda, e resolutamente vá avante. Sua natureza-Eu então ficará mais brilhante e mais transparente à medida que seus sentimentos ilusórios se desfazem como uma pedra preciosa que adquire brilho sob repetidos polimentos, até que finalmente ilumina o universo inteiro. Não duvide disto! Se seu desejo for excessivamente fraco para conduzi-lo a este estado na vida presente, você indubitavelmente chegará com facilidade à compreensão do Eu na próxima, contando que ainda esteja engajada neste questionamento na ocasião da morte, assim como o trabalho de ontem feito pela metade, é terminado hoje facilmente.