De onde vem a tradição de engajamento dos budistas?
Matthew Weiner*
Em Nova York
Os ocidentais tendem a pensar no budismo como uma religião passiva, focada na meditação silenciosa e no crescimento espiritual pessoal. A imagem de Buda sentado com um sorriso resume-a.
Então, apesar de o Ocidente estar familiarizado com conflitos e ativismo em outras religiões, a “revolução açafrão” em Mianmar e a “revolta em alta altitude” no Tibete surpreenderam muitos.
De fato, há uma tradição saudável de ativismo budista. Freqüentemente chamada de “budismo engajado”, expressão cunhada pelo monge zen budista vietnamita Thich Nhant Hanh, ela estimula uma crítica budista das estruturas governamentais e econômicas, além de esforços para aliviar o sofrimento social.
No Sri Lanka, o movimento Sarvodaya atua em mais de 1.000 aldeias em programas para dar poder aos pobres. Maha Ghosanand, monge budista cambojano reverenciado, liderou milhares de pessoas em passeatas pacíficas pelos “campos de morte”, buscando reconciliação com o Khmer Vermelho. O próprio Nhant Hanh pediu que o Norte e o Sul do Vietnã parassem o derramamento de sangue.
Na Tailândia, o “monge da floresta” Prachak “ordenou” as árvores da floresta, embrulhando-as com vestes de monges para salvá-las das madeireiras. O movimento Tzu-Chi do Taiwan tem milhares de voluntários que respondem a desastres naturais ou provocados pelo homem.
O reverendo Nagaki, da Igreja Budista de Nova York, faz uma missa anual pelo aniversário de Hiroshima. Depois de 11 de setembro, ele lembrou o uso dos campos de internação americanos na Segunda Guerra Mundial e pediu a todos os budistas que ajudassem os cidadãos muçulmanos. Nagaki gosta de mostrar uma imagem de Buda em pé.
Ele diz que o budismo envolve ter uma mente tranqüila, mas isso não quer dizer ficar apenas sentado.
Ativistas budistas citam as escrituras para argumentar que estão simplesmente seguindo o que Buda ensinou. Em uma delas, Buda confronta um assassino que está em vias de matar sua mãe; em outra, ele pára uma guerra entre duas tribos.
O terceiro exemplo é a idéia do Bodhisattwa: um ser que trabalha incansavelmente para salvar outros seres do sofrimento.
Uma fonte do engano ocidental em relação ao budismo é nosso fascínio com a meditação. Apesar de a meditação ser crítica ao budismo, como a prece é para o cristianismo, o judaísmo, e o islamismo, ela não exclui a ação, como a prece tampouco.
De fato, o foco do budismo na meditação enfatiza um estado da mente que pode levar a um tipo particular de ativismo -a meditação andando e a resistência não violenta- como demonstrado por Maha Ghosadanda no Camboja ou pelos monges em Mianmar.
Os enganos continuam com a expressão “monge budista”. “Monge” é um termo cristão para ascetas religiosos que geralmente praticam sua fé em isolamento. A palavra vem do grego “monos”, “sozinho”.
No entanto, “bikkhu”, o termo budista para monge, é traduzido literalmente como “mendigo”.
Os “bikkhus” devem ensinar e guiar a comunidade laica e mendigar por seu alimento. Desde sua introdução na prática budista, o “bikkhus” tiveram um relacionamento profundamente recíproco com o mundo laico -inclusive o governo- como professores e modelos espirituais. Eles sempre foram ativos no mundo.
Outra noção que não se sustenta em uma análise da história é que todos os budistas ativos são pacifistas; de fato, há aqueles que argumentam que nunca houve uma guerra budista. Mas há também exemplos tristes na história, de participação budista na opressão do governo e violência.
Ainda assim, é pelo ativismo pacífico que os monges budistas são conhecidos e mais respeitados. Que eles tenham se oposto à injustiça em Mianmar e no Tibete não deve ser uma surpresa. Que eles não responderam a violência com violência deve ser elogiado.
*Matthew Weiner é diretor de programas do Centro Inter-religioso de Nova York.
Tradução: Deborah Weinberg
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