Pergunta – Existe na visão do Zen uma conexão entre as pessoas, ou seja, em minha próxima vida estarei conectado com as mesmas pessoas?
Monge Genshô – Sim. No Budismo Tibetano há uma história interessante que diz que quando você bate de ombro com uma pessoa é porque você já a encontrou em quinhentas vidas. Cada coisa que acontece tem conexão, estamos aqui juntos e entre nós existe muita conexão e se você imaginar muitas vidas essas conexões podem ter sido repetidas muitas vezes. Às vezes não nos damos conta de nosso parentesco, por exemplo, todos temos dois pais, quatro avós e oito bisavós. Se chegarmos a dez gerações são mil e vinte quatro pessoas. Em mil e vinte quatro pessoas, comparando com outros mil e vinte e quatro dos teus antepassados, a probabilidade de encontrar parentes em comum é muito grande e quanto mais recuarmos, por exemplo, mil anos, veremos que nessa sala somos todos parentes.
Pergunta – Já que o senhor falou no Budismo Tibetano, os Lamas são reencarnações de antepassados, certo?
Monge Genshô – Não. São manifestações cármicas tomadas como continuidade de alguém. A palavra reencarnação é mal usada, embora você até possa encontrá-la em livros budistas, mas ela significa que uma mesma partícula tomou um mesmo corpo. O Dalai Lama atual, o décimo quarto, é tomado como uma continuação do anterior, porém temos que entender como é o entendimento oriental a esse respeito. Se formos nos basear nesse exemplo cada papa seria a continuação de Pedro, embora pessoas completamente diferentes. O Dalai Lama atual tem uma personalidade totalmente diferente de alguns antecessores, um anterior foi deposto porque era depravado. Desses quatorze, cinco foram assassinados, é uma história muito complexa e você reconhecer a continuidade dos Dalai Lamas é um procedimento altamente esotérico e místico e tem sentido dentro das escolas tibetanas, coisa que não existe no Zen, por esta razão não podemos mais do que aceitar esta tradição maravilhosa.
Não é possível comparar uma situação com a outra, mas de qualquer forma Buda, que está na raiz do ensinamento do budismo, negou a existência de almas ou espíritos que vão mudando de corpo. Não usamos a palavra reencarnação, embora ela seja prática. É mais fácil explicar para uma pessoa que não seja budista que ela deve praticar bons atos para ela mesma ter uma vida melhor após a morte. Dar essa explicação de memória, de como o “eu” surge é muito complexo, embora faça mais sentido para nós. Buda negou a existência de deuses, espíritos e almas. As vezes as pessoas me escrevem pedindo orações para os filhos doentes com câncer, por exemplo. A resposta que eu gostaria de dar à elas é que quando os deuses trabalhavam sozinhos e as pessoas oravam para eles, morriam 100% das crianças com leucemia. Agora com quimioterapia salvam-se 85%, então se seu filho ou neto estiver com leucemia leve-o para o hospital.
Pergunta – Mas então o que determinaria se uma criança morre ou não de câncer é muito mais uma questão do karma do que um progresso tecnológico?
Monge Genshô – Se você nasce um mundo onde exista progresso tecnológico é porque tem karma pra isso. Se você tivesse karma para nascer numa tribo da África e tivesse leucemia com certeza morreria. Você é nasceu num mundo civilizado, mas existem mais de um bilhão de pessoas que não saber ler e escrever. Ainda acontecem muitas coisas no mundo que são produto da ignorância e isso depende de karma. Em que família você irá nascer? Depende de seu karma. Para que mundo você se sentirá atraído? Depende de seu karma.