Colegiado Buddhista Brasileiro
Comunicado 001/2008 – Sobre Dana e a Orientação de Dharma
Estimados praticantes, estudiosos e simpatizantes buddhistas,
O Colegiado Buddhista Brasileiro (CBB), entidade voltada para o favorecimento do diálogo entre as tradições buddhistas e o mais correto e saudável exercício de entendimento sobre os fundamentos do Dharma no Brasil, gostaria de apresentar a todos os interessados sua posição acerca de questões relevantes que têm sido ultimamente levantadas por diferentes pessoas ao CBB sobre a natureza do exercício de Dana e a real condição de autoridade na orientação do Dharma por diferentes monásticos ou estudiosos seculares.
Este comunicado, no entendimento da diretoria fundadora do Colegiado, se faz necessário neste momento devido ao constante fluxo de dúvidas apresentadas diretamente ao CBB referentes a episódios associados ao exercício de eventos, cursos ou práticas buddhistas, nos quais a própria competência de conhecimento ou experiência na orientação buddhista por parte dos organizadores e o modo de solicitação dos recursos de contribuição para tais eventos são questionados.
O CBB apresenta suas considerações sobre o assunto sem, no entanto, pretender manifestar-se de forma legisladora ou julgadora em relação à liberdade de atuação das escolas buddhistas tradicionais, ou de estudiosos e pesquisadores não-buddhistas que pretendam se posicionar sobre o tema buddhista de forma acadêmica ou histórica.
Nosso objetivo, muito mais simples, é apenas esclarecer aos simpatizantes e praticantes pouco experimentados sobre os fundamentos do exercício ético e moral no buddhismo, deixando a cada um a responsabilidade de ponderar, analisar e atuar da forma mais consciente e amadurecida possível no momento em que irão decidir sobre sua participação em eventos e práticas, ou filiar-se a grupos e espaços de Dharma.
Para tal, o Colegiado Buddhista Brasileiro apresenta as seguintes argumentações:
I. Sobre o exercício de Dana
1. O exercício de Dana (Generosidade, Doação, Apoio), na tradição buddhista, representa essencialmente a ação consciente e atenta de ajuda e contribuição (seja material, de tempo ou outras) para que o Dharma possa ser estudado e exercido sob condições úteis e abrangentes a todos. Em Dana temos não somente a ação de ajuda e proteção (física, psicológica ou social) a pessoas em necessidade, mas também a ação justa e honesta para que o Dharma seja divulgado sob as bases tradicionais da ética buddhista, na forma e apoio às instituições e seu corpo monástico ou dos centros e espaços de prática.
2. É preciso fazer distinção entre monges solicitarem contribuição e centros cobrarem por atividades. Monges vivem de doações, são sustentados pelo mosteiro, e não deveriam pedir dinheiro em troca de ensinamentos. Centros atuam de forma diferente; sendo espaços sem vínculo formal com as regras monásticas (e muitas vezes sustentados por praticantes seculares), eles dependem de uma organização financeira onde as contribuições servem para favorecer as condições materiais dos professores e do próprio ambiente de estudos, os quais ali estão para facilitar o ensino do Dharma.
3. Assim, é igualmente preciso fazer a distinção correta entre um centro solicitar contribuição para realizar retiros, cursos etc (algo perfeitamente compreensível em relação às necessidades de despesas), e monásticos que porventura venham a pedir dinheiro. Um monge adota um estilo de vida e pode alertar as pessoas sobre o Dana, mas as pessoas não oferecem Dana para o monge ensinar, e sim para permitir que o monástico possa se manter na sua condição de monge ou monja. O dinheiro, portanto, não é dado ao monge pessoalmente, e sim à instituição buddhista. O buddhismo não faz barganhas com o Dharma; as organizações buddhistas não pedem dinheiro em troca da promessa de sabedoria, cura, iluminação ou qualquer tipo de prêmio espiritual. O Dana é solicitado (e deve ser conscientemente oferecido) para que as condições materiais e humanas das instituições possam se manter, e assim a prática possa sempre ser valorizada.
4. Portanto, os praticantes e estudantes precisam estar atentos ao fato de que as solicitações de contribuição não podem ser feitas de forma abusiva ou voltadas para lucro pessoal de monges ou monjas. As contribuições feitas pelos centros devem ser justas e adequadas às suas necessidades, e jamais podem se constituir excessivas. Os coordenadores dos centros de Dharma, sendo pessoas honestamente comprometidas com a prática ética buddhista, sempre estarão à disposição para facilitar os modos de contribuição dos praticantes, considerando-se as possibilidades e limites financeiros de todos.
5. Os praticantes e interessados precisam compreender que são, eles mesmos, livres para contribuir ou não. Ninguém pode exigir de outrem participação em eventos buddhistas ou centros de prática; a tradição buddhista não pratica pressão psicológica, material ou espiritual para manter pessoas entre seu corpo de estudantes ou praticantes. Ao mesmo tempo, nenhuma pessoa deveria se subordinar a qualquer espaço buddhista na pretensão de que, assim agindo, estarão garantindo algum tipo de retorno espiritual ou benefício místico. A prática do Dharma ocorre de forma livre, consciente e madura, ou então jamais será possível.
II. Sobre a correta orientação de Dharma no Brasil
6. Em relação à competência e autoridade daqueles que se apresentam como professores ou orientadores, é preciso esclarecer que a tradição buddhista brasileira possui uma profunda capacidade de formação de monásticos ou leigos dignos de serem respeitados como orientadores sérios e competentes. Entretanto, é preciso que as pessoas saibam reconhecer tal competência através da análise e observação atenta das ações destes professores de Dharma. Estes sempre serão pessoas coerentes em suas ações éticas e morais. Embora muitas vezes firmes e exigentes, também saberão ser pacientes e compreensíveis, sem nunca agir de forma irresponsável e arrogante.
7. O ensino correto buddhista se dá principalmente através do exemplo, e da dedicação dos seus professores com o próprio treinamento em Plena Consciência, base dos ensinos de Shakyamuni Buddha. Neste sentido, pretensos professores de Dharma jamais poderão agir de forma autoritária, agressiva, preconceituosa ou abusiva em relação a seus alunos e praticantes. Por outro lado, cabe aos praticantes reconhecer e respeitar a experiência e sabedoria dos orientadores – monásticos ou leigos – quando estas virtudes forem evidentes nas palavras e atos destas pessoas, agindo desta forma com respeito e atenção aos seus conselhos e posição.
8. Ninguém no âmbito da orientação buddhista deve se autodenominar “Mestre” ou assim deve ser chamado apenas por envergar manto monástico ou, sendo leigo, apresentar-se como alguém entronizado em sabedoria mística ou semelhante. O título de Mestre se constitui de grande significado, e somente é dado àqueles que representam no buddhismo o mais digno exemplo de amadurecimento na prática contemplativa e sabedoria no exercício do Dharma. Os praticantes precisam ficar atentos a pessoas que vaidosamente se autodenominam mestres ou líderes místicos, ou que pretendam criar em torno de si grupos de discípulos sem realmente demonstrar os mais básicos fundamentos em coerência e comportamento. Professores sérios tem linhagem clara e um mestre de escola tradicional que os autorizou; a citação de linhas múltiplas e extensos currículos de diferentes correntes místicas é um quesito a ser olhado com extremo cuidado, para não dizer com precaução.
O CBB, ao apresentar tais ponderações, espera ter contribuído para conscientizar todos os simpatizantes e praticantes, facilitando sua reflexão atenta no momento em que entrarem em contato com organizações buddhistas ou monásticos pertencentes às tradições reconhecidas.
O Colegiado se mantêm aberto a dar mais esclarecimentos a todos os interessados, através de seu e-mail oficial em: cbb@cbb.bodhimandala.com
Em nome do Dharma,
Assina o Sr. Presidente do Colegiado Buddhista Brasileiro,
Prof. Shaku Hondaku (Maurício Ghigonetto)
Assinam os membros da Diretoria Fundadora do Colegiado Buddhista Brasileiro,
Rev. Shaku Haku-Shin (Wagner Bronzeri)
Monge Meihô Genshô (Petrúcio Chalegre)
Prof. Dhanapala (Ricardo Sasaki)
Prof. Tam Huyen Van (Claudio Miklos)
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No Dharma,
Tam Huyen Van
(Claudio Miklos)
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Sarve Bhavantu Mangalam
http://tamhaovan.multiply.com