Aluno: Segundo a psicanálise, é o sofrimento que faz a pessoa se libertar de repetições, mecanismos, vícios. Como educador eu já percebi que às vezes tirar uma pessoa da zona de conforto provoca sofrimento, mas ela vai crescer com esse movimento. Como que fica para o budismo essa questão? Uma aparente contradição.
Monge Genshô: O sofrimento é o caminho mais curto. Os mestres cansam de dizer isso. Hoje me escreveu uma senhora que diz que seu marido tem outra e quer ir embora: “eu estou desesperada, eu não como mais, e eu estou doente. Por favor, socorra-me”. E eu disse: “mas se ele disse que vai embora, ele fez uma escolha, isso está decidido. Talvez seja uma grande oportunidade para você. O que você faz agora? Levante-se da cama, tome um banho e faça uma refeição”. O sofrimento é ótimo para ela neste momento, porque ela pode fazer uma escolha, ela pode mudar sua vida, tem grandes oportunidades que ela não está enxergando, e só não enxerga porque quer permanecer na situação que já existia. Sofrimento é realmente o caminho mais curto para as revoluções pessoais, isso eu não tenho dúvida nenhuma.
Existe um violinista chamado Itzhak Perlman, e ele toca numa cadeira, sempre sentado, porque teve paralisia infantil. Eu li um artigo dele dizendo que por ele ter ficado com as pernas paralisadas, por causa disso ele é um grande violinista, porque era tudo o que restava para ele. Ele não podia correr, jogar bola, não podia um monte de coisas. Todos os colegas podiam fazer, mas ele só podia se dedicar ao violino, e porque ele se dedicou, então ele é o violinista que tocou o fundo do filme “A Lista de Schindler”. Ele é aquela pessoa admirada no mundo todo porque teve um sofrimento que o conduziu àquilo. Não se engane: para todas as pessoas que têm grandes realizações, cada realização custa um esforço titânico. Você tem que ficar lá treinando e treinando e sofrendo muito. Não vem nada fácil, e as realizações espirituais também são assim. Por isso que eu nunca falo para alunos que não se sentaram em Zazen.
Uma vez veio um senhor depois do zazen, pediu para entrar e ouviu uma palestra. Na semana seguinte fez o mesmo, e então eu o chamei e falei: “você não pode fazer isso. Ou você vem fazer Zazen e sofre ali sentado, ou eu não quero você numa palestra. Então não venha”. “Ah o monge não é muito compassivo”. Os monges zen não são compassivos. Eles têm que ser duros, essa é a nossa tradição.