Pergunta: Pelo que entendi é: se tem um problema o budista vai lá e resolve, ele não fica isento de nada. Ele resolve. Ele só não se apega a um sentimento que se desviou da expectativa dele.
Monge Genshō: são as suas paixões que lhe perturbam, não são os fatos. Se quebrou um copo, é uma coisa bem simples, juntamos os cacos e pronto. Não precisamos reclamar de ninguém, não precisamos nos aborrecer com isso, não precisamos de nada disso. Você não precisa colocar nenhuma emoção nisso.
O mesmo acontece com todas as coisas da vida: todo sofrimento vem da paixão que você colocou. Se você estiver desapegado, não colocará paixão nas coisas.
Pergunta: Como funciona com relacionamentos então?
Monge Genshō: o que ocorre na realidade é que estou dizendo isso, mas se, por exemplo, um filho meu morrer, eu vou chorar e você vai me ver entristecido durante muitos dias. Porque mesmo que eu faça esse raciocínio e entenda, o apego e a paixão estão aqui dentro de mim. Eu seria muito estranho se alguém informasse a morte de um filho meu e eu respondesse: “ah, natural, todos os seres vivos estão sujeitos a morrer”. Se assim fosse, eu seria um ser sem mobilidade emocional. Mas não é assim – nós somos frágeis, temos sentimentos e tudo mais.
A questão é que nós nos entristecemos e nos aborrecemos com muitas coisas que estão longe de ter esse peso, por exemplo, da morte de um filho. Coisas que estão bem longe de uma relação emocional dessas. Eu acho que já existe sofrimento suficiente no teu relacionamento amoroso, familiar, etc., para você se incomodar como uma roupa que estragou, com um carro que foi roubado, com a opinião política dos outros, com insultos de alguém.
Então o terreno pelo qual você pode ser atingido pode diminuir muito, muitíssimo. Na origem do budismo, os monges abandonavam tudo, inclusive família, para levar ao mínimo absoluto todos os envolvimentos. Então ficavam sem nenhuma paixão, nenhum amor, nenhuma ligação. A ordenação monástica chama-se “shukke tokudo”, que significa “deixar o lar, deixar tudo, todas as amarras”, e isto sim seria profundamente libertador.
No modelo que nós estamos vivendo aqui, que é o meu e o de vocês, os leigos são um pouco monges e os monges são um pouco leigos. Eu tenho ligações familiares, então isto logicamente vai ser passível de criar sofrimentos.