Aceitar o Inevitável

Aceitar o Inevitável

Se você está dirigindo na rua, no tráfego, e há um engarrafamento, e os motoristas, na pressa de continuarem seus caminhos, mesmo estando tudo trancado, fecha os cruzamentos, aí você vem dirigindo e fechou o cruzamento e não vai abrir, porque está tudo bloqueado, de modo que você não poderá passar para o outro lado, você fica irritado com isso? Protesta ou buzina? Ou simplesmente espera como a gente espera que a chuva passe? 

Se não há esclarecimento o suficiente nas outras pessoas, não adianta sair brigando, não vale a pena. Nada fazer, nesses casos, é como preservar a sanidade mental e a paz na sua própria mente. Se as circunstâncias em volta tentam deslocar-lhe desse centramento, a única opção é eu ter me sentado [em zazen] o suficiente para saber que minha mente funciona assim, e eu não vou permitir que ela se desvie agora. Então, apesar da turbulência de tudo o que está acontecendo, eu vou simplesmente esperar. Não acontecerá nada por eu esperar, e, mesmo que aconteça alguma coisa inevitável, você tem que saber aceitar.

Uma vez o meu primeiro professor me perguntou: “Se você está em um local e há quatro montanhas, uma na sua frente, outra nas suas costas, outra de um lado e outra do outro (ele era Japonês, e no Japão terremotos são comuns, ocorrem todos os dias), se as quatro montanhas começam a cair em cima de você  e não tem nenhum lugar para ir, o que você faz?”. Eu disse: “Não sei.” Ele replicou: “Tão simples – deixe cair. Você aceita, senta e deixa cair. Porque, se é inevitável, você tem que saber aceitar”. 

Eu fui no meu primeiro sesshin (retiro) com esse professor, e ele tinha recentemente vindo do Japão, e lá usa-se com frequência o kyosaku – esse bastão que está em cima do altar. Havia um praticante que era japonês, o único japonês que estava naquela prática, e tal praticante começou a gemer no sesshin porque estava sofrendo. No intervalo entre uma sessão de meditação e outra, o mestre falou: “não façam ruídos porque atrapalham os outros! Não deve haver ruídos durante o zazen!”. Quando recomeçamos a prática, o homem recomeçou a gemer. Eu então ouvi o mestre levantar-se e pegar o bastão, foi até as costas do praticante e bateu até quebrar o bastão. Daí então gritou com ele em japonês e eu não pude entender. Quando saímos eu  me aproximei do praticante e perguntei:

–                “Tanaka, o que foi que ele disse?”

–                ”Eu não gosta de japonês, japonês muito violento”

–                ”Mas Tanaka, o que foi que ele falou?”

–                ”Você está gemendo aí por pouca coisa! Como você vai enfrentar a hora da sua morte?”

  

É isso que tem que estar presente na mente do praticante espiritual: você está realmente preparado para a hora da sua morte? Porque pode acontecer hoje, amanhã, a qualquer momento. Que mente você tem? É uma mente capaz de aceitar todas as montanhas caindo em cima de você?

Se você se sentar e aceitar o inevitável, bom, então vai morrer bem.
[N.E.: trecho de palestra proferida por Meihô Genshô Sensei]