Você corta seus cabelos e joga fora, vão para o lixo; você corta suas unhas, a mesma coisa. Seu corpo está se desfazendo a todo tempo. Não só os pedaços estão se desfazendo, mas todo ele, e se você se socorre de crenças do tipo “ah, eu tenho uma alma imortal que vai continuar depois da morte e vai para o paraíso”, você não está fazendo mais do que arrumar mais uma fantasia para escapar, não é real.
Nós, aqui no Zen, não estamos à procura de crenças, ilusões ou promessas fantásticas. No Zen, nós queremos encontrar a realidade tal como ela é, como é verdadeiramente. No fundo, quem sou eu além do meu nome e forma, quem eu era antes dos meus avós, bisavós, quem? Se esse eu é assim tão evanescente e temporário, se não posso me agarrar no meu eu para descobrir quem sou, o que eu sou além do meu eu?
Por isso temos no zendô uma estátua de Manjushri. É uma estátua de pedra sabão feita por um monge mineiro. Este monge era de cor e deu a ela as mesmas feições africanas. E Manjushri está sentado tranquilamente sobre um leão. Esta é a imagem do que acontece com as pessoas na sala de meditação: vocês estão sentados sobre uma mente feroz e turbulenta, mas vocês têm que se sentar tranquilamente, sentar-se com esta mente. Como é que vocês fazem com que ela se acalme, com que ela pare? Como é que você descobre quem você é, como você descobre a sabedoria, como se livra de todas as ilusões e de todas as crenças?
Essa é a experiência para a qual nós chamamos as pessoas no Zen. Acalmar-se, serenizar-se, isso tudo é muito bom, mas são subprodutos primários da prática. A questão fundamental é a Iluminação, o despertar de todas as ilusões. É rever o mundo com seu brilho. É descobrir uma felicidade que está além de todas as angústias do existir, que está além de vida e morte.
[N.E.: trecho de palestra proferida por Meihô Genshô Sensei]