(CONTINUAÇÃO)
Eu não estou aqui na condição de alguém que sempre acertou na prática do Dharma de Buddha. Eu estou aqui justamente porque eu dei muita cabeçada. E eu procuro ensinar a quem vier aqui a melhor maneira, a correta maneira de praticar. Por isso que quando alguém vem entusiasmado, fala alguma coisa, eu tenho que dizer “Olha, não é bem assim”. A função do professor de Dharma é ser paciente e amigável, mas, às vezes, tem que ser duro. Porque todo bom professor de Dharma – eu não digo que eu sou um bom professor de Dharma, mas que eu estou tentando ser – precisa aprender mais com os erros que ele cometeu na vida do que com os acertos. Porque são os erros que indicam o que precisa ser melhorado.
A experiência que nós temos aqui é uma experiência que exige muito tempo, mas é uma experiência que vale a pena ser vivida. Ajuda a nos tornarmos pessoas melhores, menos egoístas, mais atentas, prestar mais atenção ao que está acontecendo. Ali, lá fora, na vida, não andar ali fora como se fosse um zumbi, sem se preocupar com o sofrimento alheio, sem se preocupar com as questões que ocorrem no mundo. A prática é ter consciência da vida como ela é. E o maior valor na prática é aprender que a vida não é o que a gente quer que a vida seja. A vida não é a ilusão que nós criamos de nós mesmos na vida.
Essa imagem que nós temos de nós mesmos, essa imagem é uma ilusão, nós temos que quebrar essa imagem para realmente encontrar nossa verdadeira face. Descobrir quem verdadeiramente nós somos, a partir daí podemos crescer. Foi isso que eu aprendi ao longo desse tempo todo. Dias, meses, anos, tentando formar um grupo, no início tendo a ilusão de achar que eu sabia ensinar. Eu não tinha nada para ensinar e me metia a ensinar. Com o tempo, as aprendizagens vieram. E agora, mesmo que eu não tenha terminado meu caminho, eu posso ensinar alguma coisa.
Aqui eu já vi pessoas ótimas, que ajudaram. Os zafus em que vocês se sentaram foram doados por várias pessoas generosas. Algumas ainda permanecem aqui, outras foram embora devido às questões pessoais. São rostos que eu vi e foram embora. E agora eu tenho a face de vocês. E cada um que vem, seja a pessoa ficar, seja ela um dia ter que ir embora, eu sempre procuro ensinar “Confie em si mesmo e procure sempre praticar”. Eu demorei quase trinta anos tentando formar uma sangha para descobrir que a sangha só se sustenta se nós temos a sangha em nós mesmos. E praticamos na nossa vida, praticamos na nossa casa. Essa sangha ela não existe só para hoje.
Vocês todos precisam praticar no seu dia a dia, para quando vocês vierem para cá, nós possamos experimentar juntos dias, meses e anos de experiência e de aprendizagem. Isso é a sangha. Pessoas vivendo experiências, mudando, para melhorar a sua consciência, melhorar a sua percepção e aprendendo alguma coisa. Porque acreditem: sempre aprendemos alguma coisa. Sempre há algo para aprender. Isso nunca vai terminar. Nem mesmo Buddha parou de aprender, nem ele parou de praticar a meditação. Todos nós aprendemos. E as práticas que nós temos aqui servem para reforçar essa grande sabedoria. Nós praticamos juntos para aprendermos juntos e trocar o que nós aprendemos. Olhar para o outro e ver “Ele também se esforça, eu preciso me esforçar”. Isso é uma coisa muito boa e é boa porque ela é livre. Ninguém aqui está preso, nada do que fazemos aqui depende de qualquer obrigação. Isso é uma maravilha. E essa é a maravilha do Buddha, ele ensinou que a prática é ser livre, não ficar preso.
E é um contrassenso ensinar consciência e liberdade e querer obrigar vocês a ficarem. Quero que esse ano todo mês tenhamos zazenkai. E sempre que vocês puderem participar será bom para vocês. Mais uma vez agradeço à Lúcia-san e ao Anshin-san por permitirem que isso aconteça, e agradeço a todos vocês pelo esforço. Isso é muita coisa. Muito obrigado.
Teishō proferido por Kōmyō Sensei em 3 de março de 2023 na sangha de Niterói.