Algumas pessoas me falam sobre o medo. Ora têm medo de morrer, ora têm medo de ficar doentes, ora têm medo de perder relacionamentos, têm medo do fim das coisas, têm medo de perder empregos, etc. O medo é um sentimento de uma certa utilidade para nos impedir de agirmos de forma temerária, para nos levar a escapar de perigos e não nos metermos em situações perigosas. No entanto, quando ele se torna irrazoável e se concentra em perspectivas do que pode ser que venha a acontecer ou de acontecimentos futuros inevitáveis, ele se torna paralisante e um ladrão de nossa energia e tranquilidade.
A natureza da nossa própria existência é impermanência. E, portanto, em primeiro lugar, devemos aceitar que as coisas mudam e que isso não é necessariamente um mal, mas, pelo contrário, se todas as coisas permanecessem sempre iguais, isso sim seria uma impossibilidade de aperfeiçoamento, seria uma impossibilidade de mudarmos nosso karma. Assim, o fato de haver mudança em vez de ser olhado com receio deve ser olhado como oportunidade.
Por outro lado, o medo tem algo a ver com nossa autopreservação, preservação de nosso eu. Como expliquei, há aspectos positivos nisso. Mas ao nos agarrarmos àquilo que é uma construção, uma fantasia, perdemos a possibilidade de nos elevarmos mais alto do que estamos agora. O fato de haver mudança nos leva inevitavelmente a um fim das coisas e das nossas próprias vidas, mas essa também é uma grande oportunidade. Quando deixamos essa vida, abre-se um leque de possibilidades maravilhosas à nossa frente, e se realmente percebêssemos como é nos perguntaríamos: “por que quando alguém morreu eu chorei tanto?”. Porque essas oportunidades e esse estado de nascer e morrer têm dentro de si luz, possibilidade, oportunidade e continuidade. É, na verdade, impossível para nós deixarmos esse ciclo de existências sem nos tornarmos um Buddha completamente liberto.
Somos, na verdade, pura continuidade. Tudo continua, e tudo aquilo que tanto tememos perder, tudo aquilo pelo que choramos, na verdade, simplesmente se transforma e continua.
Se virmos a vida e sua continuidade, poderemos compreender que estamos subindo uma escada. Podemos eventualmente parar, podemos até descer degraus, mas se olharmos para o alto, há luz e possibilidade.
Assim, o medo é apenas um artifício para nossa preservação, e não precisa ser cultivado, porque pensar no futuro também é perder o presente. É isso que treinamos no zazen: aprender a dádiva que é estar presentes. Aprendemos a viver neste momento, este agora, a vida tal como é, e não nos perdermos em imaginações sobre o futuro ou, por acaso, agarrarmo-nos a coisas que são mera memória modificada pelos nossos pensamentos e, portanto, também de certa forma irreal.
Meu mestre dizia: “enjoy your life!”. “Enjoy” é aproveite ou desfrute. “Joy” quer dizer alegria. Aproveite sua vida com alegria, porque você sempre desejará oportunidades como essa. Não perca sua força pensando no futuro e tendo receio do que as mudanças nos trarão.
Aproveite sua vida com alegria!
Teishô Matinal proferido por Meihô Genshô Sensei, maio de 2021.