Pergunta: Como podemos construir bons hábitos?
Genshō Sensei: Simplesmente praticando, com a repetição. Há uma imagem boa a este
respeito: se um ladrão aparece aqui, pega a bolsa de alguém, sai correndo e vamos
correndo atrás, conseguimos segurá-lo e dizemos: “você é um ladrão”. Ele pode dizer:
“não sou ladrão, apenas estava imitando um, fingindo que sou ladrão”. O que vamos
pensar? Não vamos acreditar nisso, porque ele cometeu atos de ladrão, então ele é um
ladrão. Para nós é a mesma coisa.
Nós não somos bons, mas podemos fingir que somos bons, podemos fingir que somos
Budas. Se fingirmos que somos Buda, sentarmos como Buda, quem será essa
pessoa sentada? Será Buda, porque aquele que age como Buda é Buda. Ele age
compassivamente, ensina como Buda, pratica como Buda e então torna-se Buda.
Você fuma e um dia resolve fingir que não é fumante, passando a não fumar. Todo o
tempo você finge que é não fumante e assim você se torna não fumante. É simples.
Há um mestre que diz assim: “mesmo quando você estiver sozinho, aja como se
estivesse na presença de um convidado importante”. Esse é um ensinamento
maravilhoso. Quando estiver sozinho, fechar a porta do banheiro, por exemplo, se
começar a fingir que está na presença de alguém, vai deixar tudo limpo, alinhar o tapete,
pendurar as toalhas, se vir alguma sujeira irá limpar, porque estará querendo causar boa
impressão. Mas você tem que fazer isso sozinho e com o tempo aquilo simplesmente irá
se tornar hábito e você não poderá agir de maneira diferente.
No budismo nós temos muitos “gathas”, que são versos. Por exemplo, de manhã ao
colocar o rakusu, você diz: “Óh, grande manto da libertação, além da forma e do vazio,
uso os ensinamentos do Tathagata para libertar a todos os seres” e só então você o veste.
Cada vez que vai usá-lo faz isso de forma que o rakusu torna-se importante. De repente
você não pode mais entrar no banheiro usando o rakusu, porque é importante demais.
Hoje cedo quase me esqueço e entro no banheiro com ele. No fim ele é apenas um
pedaço de pano, com retalhos costurados, mas se todo o tempo eu o trato com respeito,
se quando o coloco recito versos e quando o tiro faço isso de forma ritual, ele acaba se
transformando num objeto de treinamento.
O processo do zen é transformar as coisas todas em objetos de treinamento. Você tem
dificuldade de ter hábitos corretos, mas se muda sua forma de agir vai atingindo sua
mente. Se vê objetos desorganizados e os arruma isso significa ter uma mente atenta, ao
fazer isso sua mente é atingida. Agora se você tiver TOC, é melhor deixar um pouco
desarrumado, para desarmar a sua neurose.
Minha esposa tem um pouco de TOC, e quando eu estacionava o carro, se o limpador de
parabrisa não ficasse exatamente no lugar, ela me pedia imediatamente para arrumar.
Então eu disse: “vou ter que deixar sempre desarrumado então, para que você treine para
não se perturbar”. Aprender a fazer isso é possível também, agora que ela treinou
bastante e conseguiu, agora sim posso deixar arrumado. Então nós temos que entender
as diferenças. O professor pode fazer as coisas ao contrário com algum aluno, por
exemplo, para atingi-lo de uma forma diferente. Isso tudo são maneiras de construir
hábitos. Os bons hábitos criam bom carma, é como a agulha que cai sempre no lado
mais fundo, quando estamos escutando vinis, se estiver arranhado ela volta e passa pelo
arranhão. Isso serve para quem já usou as vitrolas. Da mesma forma você vai marcando
de modo que o hábito volta para o lugar automaticamente e sua mente é atingida.
Mas estamos aqui falando sobre a forma, e no fim você tem que ir além e mudar os seus
hábitos de pensar. Se vier um pensamento, você deve observar se esse é o pensamento
correto, o pensamento compassivo e se questionar: “como deveria ser meu
pensamento?”. Deveria se perguntar se em vez de desgostar dos atos de alguém, não
seria melhor pensar quais os motivos no fundo que motivaram esses atos, quais foram as
perturbações dessa mente que os fez e se compadecer dela, sem deixar pensamentos
negativos te invadirem. Esses pensamentos negativos vão destruir a paz da sua mente,
enquanto os pensamentos compassivos não, eles vão ser consoladores, vão ser bons e
vão melhorar o mundo.
Em última análise, temos que mudar nossos pensamentos. Começamos com os atos,
depois mudamos nossas palavras, você pensa mas nem fala, e depois muda seu
pensamento, porque se mudar seu pensamento, pronto, seu carma começará a mudar.