Pergunta: Talidade então seria a condição para a quebra das ilusões . O aprofundamento da prática permite você vislumbrar momentos de talidade. Mas a quebra das ilusões pode gerar também um sentimento de desencanto, um sentimento desconfortável, não é?
Monge Genshô: quando surge este sentimento desconfortável de desencanto é porque não fomos longe o suficiente.Pode surgir, por exemplo, na prática, um sentimento de grande tristeza. Em geral o sentimento que surge primeiro é de alegria e contentamento. Os sentimentos de tristeza surgem mais adiante, sentimentos de grande tristeza com o sofrimento do mundo, com o fato da vida na terra ser tão cheia de coisas insatisfatórias ou mesmo de maldades. Agora, isto surge porque o praticante está imerso na noção de sujeito e objeto. Então ele aqui está vendo o sofrimento lá nos outros seres. É necessário ir mais fundo porque indo mais fundo você ultrapassa a noção de sujeito e objeto. Ultrapassando a noção de sujeito e objeto surge uma noção de sacralidade de toda a existência e uma percepção de perfeição de tudo, mesmo o que parece mau, como perfeito. Dando um exemplo mais claro: nós olhamos para a vida humana com seu sofrimento, morte, desgraça e apodrecimento e todas as coisas que acontecem conosco, nós olhamos isso como terrível. No entanto essas mesmas pessoas que olham o sofrimento e a morte dos seres humanos e se entristecem, andam numa floresta no outono, quando as folhas caem, secam, apodrecem e morrem, olham para tudo como muito lindo. Uma visão iluminada verá tudo o que acontece com os seres humanos, mesmo a morte, mesmo o desfalecimento, mesmo o apodrecimento, tudo, como parte de um ciclo e um processo, como quando olhamos a floresta no outono. Sabemos que flores novas nascerão na primavera. Que as árvores todas ficarão secas, mas que isso não é triste. É muito lindo! E é muito lindo também quando a primavera surge e as flores novas surgem. Embora olhando para essas folhas saibamos que elas cairão, morrerão. Nós só vemos o sofrimento e a infelicidade no mundo porque não enxergamos o ciclo e o processo. Nós olhamos a vida com os nossos próprios olhos e vemos o sofrimento e a morte dos outros, nós vemos o espelho do que vai acontecer conosco, mas somos incapazes de enxergar todo o ciclo. E o ciclo completo não é triste. Ele é o que é sem nenhuma interpretação. Isso é talidade também. As coisas são tais como são, já perfeitas em si mesmas. Então tudo que nós vemos assim com desencanto é também uma interpretação e uma ilusão. Por isso a mente iluminada vê beleza e é profundamente feliz porque supera toda tristeza. No Sutra do Coração toda a dor e agonia desaparecem quando o bodhisattva vê a vacuidade. E enxergando a vacuidade dos agregados, vendo que tudo surge no vazio (sem nenhum eu inerente em nada, tudo interconectado e interdependente), quando o bodhisattva vê essa vacuidade, vê que tudo é fenômeno, (onda na superfície) então ultrapassa toda a dor e agonia. É difícil, eu sei, é muito sofisticado.