Redemoinho como analogia

Redemoinho como analogia

Pergunta – Fazendo uma comparação com o espiritismo: quando morremos, o que acontece com nossa “alma” ou “espírito” até que tenhamos outro corpo?
Monge Gensho – No budismo não falamos em almas nem em espíritos. Não falamos em uma existência corpórea separada, o que seria nós mesmos, separados de um corpo. Essa é uma noção grandemente originária no ocidente do Platonismo. Mas a noção de uma alma separada do corpo, por exemplo, não é uma noção existente no judaísmo primitivo. No Cristianismo, vem por influência grega e o Kardecismo é um herdeiro dessa tradição. É um sincretismo entre idéias hindus, budistas e cristãs. Na verdade, o budismo apenas declara que o carma, que é um movimento no universo, provoca nascimento. Mas não fala de uma alma que conserva seu “eu”, embora possamos encontrar conceitos um pouco mais próximos disso no Bardo, que é o ensinamento pós-morte do livro Tibetano dos mortos. Ele se aproxima dessa noção de uma consciência, de algo que está carregando, de uma entidade que irá renascer. Mas a explicação melhor dentro do Zen seria: olhe para um redemoinho, ele tem movimento, energia e forma e quando você olha para ele, vê um eixo em torno do qual tudo gira, mas esse eixo existe, é algo? Não. O movimento por si mesmo cria a noção de um eixo, mas não é necessário que o eixo exista para que algo seja apegado a ele. É o próprio movimento que provoca o renascimento.
Pergunta – Sei que isso é limitado, precisamos criar uma imagem para podermos entender, mas seria como ondas no oceano?
Monge Gensho – A onda continua, mas a água não se move com a onda. As ondas passam através da água. Quando eu falo o ar vibra, há ondas sonoras, mas o ar não se move para que o som chegue até seus ouvidos, só há vibração, que é pura energia. Não se moveu nada essencialmente, no entanto, o som chegou até aí. Acho que o redemoinho é uma imagem muito boa, porque permite a idéia de uma entidade e coloca tudo num movimento. Você, agindo na sua vida, provoca movimento. Há movimento, há formas de energia, impulsos, desejos e apegos – esses formam o carma. O que renasce? O que provoca o renascimento? O carma.
O carma tem um “eu”? Não. O carma provoca um nascimento e o nascimento diz a si mesmo, “eu sou”. Então, é o carma que provoca o surgimento de identidades, não são as identidades que carregam carmas. Essa é a essência desse pensamento, que é um pouco mais sutil. É mais fácil pensar num espírito que carrega uma mochila de carmas nas costas, não é verdade? Mas não é assim. É o carma que provoca o surgimento de identidades. Nós somos identidades que surgiram por causa de carmas, nossas identidades são ilusórias. Somos um sonho.