Budismo popular e budismo monástico

Budismo popular e budismo monástico

P: Não sei quanto ao Zen, mas em outras formas de budismo, por exemplo, se fala em demônios, inclusive com uma série de práticas para afastá-los, então existe algum ente de fora que está sendo considerado.
Monge Genshô – Isso funciona da seguinte forma: Existe um Budismo popular e um Budismo mais elevado. No Budismo Tibetano esse estágio mais elevado chama-se “Dzogchen” que é como o Zen, mas, o Zen, é o “caminho direto” tende a desprezar o lado popular, ao menos em sua teoria. O Zen dá respostas diretas descartando tudo que veio antes porque foi criado para monastérios e sua forma popular só surgiu mais tarde como uma espécie de concessão.
Como o Budismo Tibetano foi criado, com grande generosidade,  para atender às necessidades de toda uma nação, precisava criar recursos para atender aos analfabetos e ignorantes. O modo mais fácil de lidar com ignorantes é dar a eles um rosário e instruí-lo a dar voltas em torno do templo recitando mantras com o intuito de atrair boas energias, entidades benéficas e afastar os demônios. Como o povo tibetano tinha uma tradição xamânica com entidades e demônios, essa era a melhor solução. Isso é uma constante na história do Budismo – em vez de se jogar contra a cultura local, ele a adota e tenta transformá-la.
Vou dar um exemplo bem fácil de entender. Chega uma pessoa aqui na Sangha e diz que fará uma viagem de avião e está com muito medo de morrer. Como Monge , eu lhe daria um amuleto, “Jizo Bosatsu”, protetor dos viajantes e diria que a viagem dele estava protegida e nada aconteceria. Ele se agarraria ao amuleto confiante, feliz e tranquilo. Nesse caso, eu teria feito o bem que poderia ter sido feito para aquela mente. Estaria usando o mesmo que as formas de budismo que você cita fazem.
Mas, se chegasse um Monge, que se pressupõe estar num nível mais alto de compreensão, com o mesmo problema de medo, minha resposta seria outra, eu perguntaria – “de onde vem o medo”? “Isso vem da minha mente, estou criando esse medo” – poderia ser uma resposta, e então eu diria – “Mas por que você esta criando isso, de onde surge o medo? Você não está praticando sua meditação corretamente, vá sentar-se e livre-se da sua imaginação, de suas expectativas de futuro e viva o presente e assim você poderá fazer a viagem sem hesitar”. São duas maneiras completamente diferentes de tratar o mesmo problema.
O Budismo tem esses aspectos, mas o Zen foi criado como treinamento monástico e surgiu na China no século VII como um treinamento muito lúcido e claro, destinado a Monges. Já havia o Budismo há pelo menos quinhentos anos na China quando o Zen chegou. Isso que estamos presenciando aqui, leigos ouvindo ensinamentos dados a Monges, é uma invenção ocidental. Esses ensinamentos são muitas vezes desconfortáveis, muitas pessoas não querem ouvir isso. Outro dia li uma carta onde uma pessoa se dizia desconfortável e arrasado sem ter onde se agarrar pelo fato de ter ouvido meus ensinamentos. É assim mesmo, eu sou um professor do Zen e não um professor de Budismo devocional para falar sobre deuses, demônios e espíritos. Se for para alguém se agarrar em uma divindade protetora, porque irá sair do Cristianismo devocional? Se a crença desta pessoa funciona para ela, não há porque procurar por algo diferente e de outra cultura. Não vejo motivo para uma pessoa largar sua tradição devocional e ir atrás de outra. Se o que ela acredita está bom para ela, deve ficar com suas crenças. O único motivo para você ir atrás do Zen é se você não se sente confortável com crenças. Se você precisa de uma crença para se agarrar seu lugar não é aqui.