Pergunta – Algumas pessoas, e isso já aconteceu comigo, quando não conseguem realizar suas necessidades básicas ficam totalmente alteradas e nessas condições é muito difícil se manter lúcido…
Monge Genshô – Corpo e mente estão ligados. Isso acontece comigo também, por exemplo, no final do dia, eu, cansado, com sono e fome, depois de ter resolvido milhares de problemas, surge mais uma pessoa com problema. O melhor seria você poder deixar para outro dia, pois talvez a importância não seja assim tão grande no dia seguinte. Com o passar do tempo as coisas parecem perder a importância. Quando você não está em boas condições físicas isso altera sua mente.
Pergunta – Tudo está também relacionado com a disciplina, não é? Se a pessoa se observar e descobrir que tem determinadas reações que não são corretas, ela deve tentar uma maneira de eliminar esse tipo de sentimento?
Monge Genshô – Sim, ela deve reconhecer que não está bem. Mas ainda assim talvez o pensamento mais correto seja perceber a finitude de todas as coisas, todos iremos morrer e os problemas não têm a menor importância. Alguém pode lhe dizer de forma desesperada que sua empresa irá quebrar ou que você perderá todo seu crédito. Qual a importância disso se você irá morrer? Poderão pensar que você seja louco, mas isso é colocar as coisas sob uma perspectiva mais ampla da vida.
Um amigo me escreveu ontem pedindo conselhos, pois sua empresa está em dificuldades, o condomínio está atrasado etc. Pedi à ele que anotasse em uma folha as contas que ele obrigatoriamente deve pagar, por exemplo, comida, luz e empregados da empresa, senão a empresa não funciona e aí sim ela quebra de vez. Em outro papel as contas que se não forem pagas imediatamente nada acontece. Então ele respondeu perguntando sobre o crédito dele. Como ele já havia perdido o crédito, também não havia porque se preocupar. Mas e o condomínio? O condomínio irá lhe processar e vai entrar na justiça contra você, mas isso leva meses e quando acontecer, você propõe um acordo. Você já está com quase setenta anos, para que se preocupar tanto, imagine se você morre amanhã?
Pergunta – O Senhor está ensinando a ser caloteiro?
Monge Genshô – Isso é uma questão de sobrevivência. Os assalariados pensam muito no crédito, isso é muito importante para eles. Quem lida com empresas e grandes volumes de dinheiro frequentemente têm que tomar esse tipo de decisão, faltou dinheiro paga-se o quê? Aquilo que é importante, ou seja, o que for importante para que a linha de produção se mantenha funcionando. O banco? Fica para depois. Os impostos? Ficam para depois. Isso se chama Administração Financeira de Recursos Escassos. Vale a pena se desesperar por causa disso? Não. Existem muitos exemplos de empresários que se matam quando suas empresas não vão bem. Nada é tão importante, no fundo são apenas palavras, por exemplo, quando alguém lhe acusa de estar caloteando um banco. O que é um banco? Uma entidade que empresta dinheiro que sequer tem, através do truque da alavancagem financeira, no qual emprestam até 25 vezes o mesmo dinheiro como sucedeu na quebra de 2008. Esse é apenas um dos exemplos de quantas coisas no mundo são puramente ilusórias e apenas por acreditarmos nelas é que somos, por elas, manipulados.
Esse amigo que me escreveu estava pensando que seu nome era seu crédito, mas quem o convenceu de que isso era importante? Quem atribuiu nome à ele? Quem criou o crédito? Quem criou o instrumento de pressão sobre as pessoas? Quando as pessoas admitem essa ilusão, elas entram no jogo e podem ser manipuladas. Se você conseguir não dar importância ao seu nome e seu crédito, estará livre da pressão. Perdeu o crédito? O que você vai fazer, se matar? Claro que não, continue trabalhando, pague todas sua dívidas e peça o crédito novamente, se você quiser, é claro, pois se você estiver muito rico não precisa de crédito. Só precisa de crédito quem não tem dinheiro.
As coisas não são exatamente o que parecem e é absurdo que alguém morra por perder seu crédito ou sua empresa. Isso não é motivo suficiente para você se matar, lembrem-se, Buda deixou seu reino, seu castelo, suas roupas de príncipe, cortou seus cabelos e foi para a floresta. Ficou totalmente pobre, nada mais que um mendigo e como fez isso porque queria não sentiu-se um derrotado. É que neste momento ele tornou-se totalmente livre.
Quando acreditamos nas ilusões que o mundo nos vende, que são o nome, a forma, crédito etc., somos prisioneiros e podemos ser manipulados pelas invenções que as instituições podem criar. Mesmo as coisas que nos parecem mais preciosas como o nome de família, por exemplo, alguém o convenceu que tem um nome de família e que deveria honrá-lo. A palavra que você usou, caloteiro, é uma palavra deste sistema que coloca um etiqueta na pessoa para aprisioná-la e forçá-la a ficar dentro, útil ele, como o nome e a forma, mas uma construção mental em última análise que você pode usar se quiser e pode abandonar se decidir.