Aluno não é discípulo

Aluno não é discípulo

Retornando, nós temos um engano a respeito de “a prática é a iluminação”. Isso é uma maneira de ensinar para desarmar aquele objetivo egóico. Mas na verdade, a prática é um meio e não é a iluminação, pois você pode ser muito bom praticante formalmente e não ter iluminação nenhuma. Às vezes a gente vê monges e ou praticantes e você pensa, “ah, ele tem tal graduação, chegou a tal ponto, está treinando há vinte anos”. Aí ele grita com raiva ou ri das pessoas quando erram, ou qualquer coisa assim. Lhe falta uma qualidade compassiva. Na verdade, faltou algo. Porque a iluminação não é assim. Nós deveríamos procurar quem possa nos guiar no caminho do despertar. Então mestres de iluminação são raros. Nós temos que procurar denodadamente.
Quem viu aquele filme “Zen”, sobre a história de Dogen? Lembram que ele vai à China procurando mestres e quantas vezes ele se desilude, a tal ponto de pensar em  desistir? Até que ele encontra aquele que nós recitamos o nome hoje, Tendô Nyojo, e ele vê em Tendô Nyojo um mestre que pode conduzi-lo. Ele fica com ele por cinco anos praticando. Mas ele já praticava desde os doze anos de idade, já era monge desde os doze anos de idade. Naquela época podia-se entrar num mosteiro muito cedo, um órfão como ele era. O problema não mudou, pois em mil duzentos e tanto Dogen já sentia isto e escrevia: “que lamentável que os monges de hoje não sejam como os antigos, que os mestre não sejam como os mestres de outrora”. E lamenta a pobreza espiritual das pessoas que ele encontra.
Na verdade, essa é uma queixa de sempre. Sempre foi assim e continua sendo hoje. Nós temos que olhar com cuidado. Há um ditado do budismo tibetano “examine seu mestre por oito anos antes de aceitá-lo”. Observe-o durante oito anos e depois de oito anos: “ah sim, vou aceitar este como meu mestre, eu realmente quero aceitar”. É interessante falar um pouquinho sobre a diferença entre aluno e discípulo. Aluno não é problema, nesse momento todos vocês são meus alunos. Todo mundo sentou aqui e aceitou ouvir uma aula, não é? Então todo mundo é aluno e eu neste momento, professor. Explico, vocês aceitam. Você pode sair e dizer: “ah gostei disso, não gostei daquilo outro, não concordei com aquilo”, não tem problema nenhum, você é aluno, vem eventualmente às palestras e só. Não há nenhum compromisso ou vínculo especial.
Mas discípulo é outra coisa.
Quando alguém diz: “eu queria que o senhor fosse meu mestre”, eu entendo: “você está pedindo para ser meu discípulo”. É uma relação mais próxima. Quer dizer o que? O aluno me acompanhará, estará sob a minha orientação constante, e o que eu disser não será discutido.  Se eu disser “esse chão é de madeira”, você tem que olhar para o chão e dizer: “ele diz que é de madeira. Então minha concepção de cerâmica está errada. Cerâmica é madeira. Por quê ele disse que cerâmica é madeira? Vou ter que entender isso”. Mas não há uma contestação. Tem um “eu é que devo estar enganado, então vou pensar a respeito”. Aí daqui a dois anos, se eu entender porquê cerâmica é madeira, digo: “ah, muito obrigado por ter me ensinado aquilo”.